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terça-feira, 24 maio 2022 20:28

Makwai: uma dança, uma ciência e uma forma de celebração

Ilustração aproximada de Makwai Ilustração aproximada de Makwai

Makwai é uma dança tradicional originária do sul das províncias de Sofala (Machanga, Buzi e Chibabava) e Manica (Machaze, Mussorize e Sussundenga) com o povo Ndau. A dança é também é praticada nos distritos de Mambone e Inhassoro, na província de Inhambane. Mais tarde, Ngungunhana e seus guerreiros levaram a dança de Goi-Goi no distrito de Mossurize em Manica, para a província de Gaza, quando instalaram a base do Império de Gaza no distrito de Mandlakazi, e foi aqui de onde surge a variante Makwaiela, dançada fundamentalmente no sul de Moçambique.  Na província de Sofala, a forma de dançar Makwai varia de distrito para distrito, mas há  passos identitários da dança, os chamados passos de base, que também acontecem na dança Utsi.

Antes de a dança ser designada de Makwai, esta tinha o nome de Xiquema, que eram somente os passos da dança, que mais tarde a associação destes passou a se chamar de Makwai.

 Makwai, uma forma de transmissão de conhecimentos

Para melhor entender sobre a dança Makwai, conversámos com os senhores Domingos Manuel e Ernesto João, praticantes da dança e residentes na província de Sofala. Domingos Manuel explicou que a dança Makwai surgiu com um casal de idosos que almejava ensinar aos adolescentes e jovens as melhores maneiras de terem relações sexuais, explicando como deviam proceder quando um homem e uma mulher estivessem a sós num quarto. Para os adultos e casados, o Makwai surgiu como uma forma de ensiná-los as diversas formas de como estes deviam se comportar dentro de sua casa, como tratar o seu parceiro (a).

À medida que o casal de idosos ia transmitindo os seus conhecimentos para os adolescentes, jovens e adultos, este foi percebendo que estava sendo difícil explicar aos seus netos sobre o tema de relações sexuais. Assim sendo, surgiu a necessidade de adotar um método de ensino que pudesse fazer com que os adolescentes e jovens entendessem com facilidade a sua explicação.  Desta forma, surgiu a ideia de explicar como se fosse uma história.  O casal se reunia com seus netos, adolescentes e jovens nas noites e contava a história em volta da fogueira, durante as explicações, o casal notou que para a além de estar só a volta da fogueira e a explicar sobre a relação sexual, poderia explicar em formato de uma dança, daí o casal decidiu procurar bidões e paus para produzir sons acompanhando a explicação, de modo a representar batuques. Depois de as crianças aprenderem a cantar, os idosos passaram a imitar alguns movimentos que se fazem durante a relação sexual, explicando aos seus netos, a outros adolescentes e jovens de como devia se proceder na relação sexual. Ao imitar os gestos que se faziam na relação sexual, foram surgindo alguns passos que com o passar do tempo foram sendo articulados e desta forma a dança deixa de ser considerada Xiquema (simplesmente os passos) e ganha o nome de Makwai.

Quando o casal de idosos ensinava os passos, estes ganhavam prática e, naquele momento, podiam ter a oportunidade de sanar algumas dúvidas que podia haver por parte de seus netos, que não eram expostas por causa da vergonha.

Durante a dança, ao imitar alguns gestos, a mulher podia dar um giro e cair no Chão, e o homem ia por cima da mulher, simulando assim um acto sexual com gestos. Em seguida, as mulheres deviam imitar o que a mulher estava fazendo, e os homens deviam imitar o que o homem estava fazendo. Por sua vez, o senhor Ernesto João acrescentou que à medida que o tempo ia passando, ao invés de os idosos chamarem os adolescentes e jovens, estes passaram a chamar-se uns aos outros para a casa do casal, supondo que num determinado dia haveria um ensinamento de um novo passo. Quando chegavam na casa dos idosos, antes de os idosos ensinarem novos passos, primeiro recapitulavam os passos aprendidos no encontro passado, de modo a não permitir que os aprendizes esquecessem, e depois seguiam com os passos novos.

Com a prática desta dança, tanto os homens como as mulheres começaram a ter o domínio dos passos e aprender a dançar. “Os gestos praticados deviam dizer o que o homem ou a mulher devia fazer numa relação sexual. a cada encontro que havia, as crianças aprendiam novos passos, e juntavam os passos e faziam o Xiquema que mais tarde passou a se chamar de Makawai”, explicou Ernesto João. Para além da vertente educativa, tanto para os adolescentes como para adultos, o Makawai era também usado para expressar a tristeza de uma mulher, quando o seu marido não lhe dava atenção, ou lhe tratasse de uma forma inadequada. Para expressar a sua tristeza, a mulher podia chamar as suas vizinhas ou amigas e começavam a cantar uma música que pudesse fazer perceber ao marido a situação incómoda.

No início, a dança não era praticada com as saias de palha como nos dias de hoje, usavam-se apenas a capulana e algumas saias chamadas de patricinha (saias normais samantadas ou cortadas). Na altura, as crianças não deviam aprender a dançar o Makwai, porque esta servia para explicar sobre a relação sexual, e era praticada por idosos.

O Makwai nos dias de hoje

Segundo Domingos, para além de a dança servir como um meio de ensinamento sobre as boas maneiras de se comportar com os seus parceiros e a fazer a relações sexuais, as pessoas foram percebendo que podiam aprender os passos e ensinar as outras pessoas, e foi dai que a dança deixou de ser praticada só por idosos e passou a ser usada para representar a cultura da província de Sofala. A dança é hoje praticada em momentos de celebração, como as grandes colheitas do arroz, milho e nas cerimónias de ritos de iniciação, cerimónias de Estado, casamentos, entre outras ocasiões.

Diferente da dança Utsi, o Makwai é praticada por homens e mulheres. Devido a evolução da dança, actualmente é praticada por crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos. Para dançar o Makwai usam-se de 3 a 5 batuques, com destaque para o Cóa, o Ritmo, Solo e o Marcador.

Escrito por Margarida Amadeu para Tsevele, com contribuição de José Carlos.

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