tsevelelogo

terça-feira, 18 outubro 2022 19:44

Monumento aos Heróis Moçambicanos: a história de um povo contada em uma parede

O Monumento aos Heróis Moçambicanos O Monumento aos Heróis Moçambicanos

O Monumento aos Heróis Moçambicanos é uma obra de pintura pincelada no murro situado em frente à Praça dos Heróis Moçambicanos, na Cidade de Maputo.

Ao contornar a estrela gigante deitada no centro da rotunda da praça onde descansam as almas daqueles que deram os seus corpos às balas, à pólvora ou a qualquer outra vicissitude vivida durante as batalhas pela resistência ao domínio colonial português, em Moçambique, é quase impossível não notar o brilho das cores, traços e desenhos alojados na enorme obra de arte a céu aberto, a onde a entrada do sarcófago está virada.   

De uma estrutura curvilínea e de grandes dimensões, com cerca de 100 metros de largura e 5 metros de altura, O Monumento aos Heróis Moçambicanos encontra-se na ponta este da grande estrela da Praça dos Heróis Moçambicanos. Decorado pela relva verde, em todo o perímetro, e pequenas plantas nas bordas, a servir de adorno, o Monumento aos Heróis Moçambicanos é um trabalho artístico que homenageia a bravura, a resiliência e o comprometimento de todos aqueles que não só acreditaram, mas também arregaçaram as mangas, pegaram em armas e foram atrás da tão sonhada autonomia de todo um povo.

 Encontra-se na margem que pertence ao bairro Mavalane, sendo limitado, a direita, pelo edifício do Ministério da Agricultura e Segurança Alimentar, e o Bairro da Urbanização, a esquerda.

É um trabalho assinado por João Craveirinha. Nele, o pintor e poeta conta e reconta a história de Moçambique, destacando à trincha os principais factos que denotam as origens e progressos de todo um povo unido na busca de um ideal comum, que apesar dos diversos desafios enfrentados manteve-se firme na luta pelas suas utopias. O Monumento aos Heróis Moçambicanos descreve acontecimentos históricos, narrados numa sequência temporal e seguindo uma linha realista, que vai desde à resistência colonial, passa pela proclamação da independência nacional, indo desaguar num futuro que se pretende próspero e risonho.

O Monumento aos Heróis Moçambicanos existe desde 1979, ou seja quatro anos depois da independência nacional. Na altura, o país já estava de braços com o conflito interno, conhecido como Guerra Civil ou Luta dos Dezasseis Anos, facto que ia em contramão em relação aos anseios e expectativas que marcaram o fim do regime colonial.

Assim sendo, uma das estratégias adoptadas pelo Governo, para contrariar os avanços da também conhecida como Guerra das desestabilizações foi imputar no imaginário social a ideia de unidade nacional, alicerçada no princípio da igualdade de direitos e deveres do cidadão, independentemente da cor, raça, género, proveniência, filiação e qualquer outro factor. Por essa razão, é possível que o Mural também tenha servido como arma ideológica, usada para exaltar a unidade dos moçambicanos na busca pela ambição de construir uma nação, livre da guerra e de qualquer tipo de discriminação.

A narrativa começa no capítulo da invasão colonial, ou o momento em que as tropas portuguesas avançaram, pela primeira vez, contra os reinos que coexistiam no território que hoje é Moçambique. João Craveirinha viaja pelas humilhações, torturas, saque e pilhagem de recursos contra a vontade dos nativos, expondo ao público que por ali passa - seja pela Avenida das FPLM ou Acordos de Lusaka - o sofrimento a que os povos africanos eram submetidos, mas também evidencia o despertar da consciência coletiva, movido pela crença de que a liberdade era e continua sendo um bem comum, possível de ser alcançado unindo forças na mesma visão.

A viagem no tempo a bordo dos pincéis de Craveirinha no mural em reverência aos Heróis Moçambicanos faz menção a figuras cujo papel é indelével para o alcance da independência de Moçambique. No murro, vê-se Mondlane como moralizador das massas, devolvendo a convicção de que o homem é livre. Sob liderança de Eduardo Mondlane - quem menciona na sua obra "Lutar por Moçambique" o contributo de João Craveirinha e outros artistas na luta através das artes - o povo uniu-se de norte a sul, quebrou correntes e formou uma e única frente com que iniciou a revolução, segundo o que se pode ler no Monumento aos Heróis Moçambicanos, em Maputo.

João Craveirinha segue relatando a memória aos pincéis. Faz referência ao 3 de Fevereiro de 1969, em Dar-es-Salam, capital da Tanzânia, data e local em que Eduardo Mondlane foi abatido num atentado à bomba. Apesar da morte de Eduardo Mondlane, a quem é atribuído mérito de Arquiteto da Unidade Nacional, ter sido uma grande contrariedade para as tropas pela independência, o povo não se vergou.

Com Samora Moisés Machel na dianteira, as Forças Populares de Libertação de Moçambique voltaram a apontar os canos ao fascismo português, numa fase em que o conflito tornou-se ainda mais avassalador, a julgar pelas enumeras vidas que sucumbiram em ambos os lados, ilustradas no mural.

Houve mortes, mas também houve sossego. No mural, é possível sentir a euforia que marcou o 25 de Junho de 1975, a data da proclamação da independência. Uma bandeira branca e o brilho dourado de um sol nascente sugerem a ideia de paz e riqueza, dois ingredientes indispensáveis para o destino que se desejava. Além destes, está ainda evidenciada uma tocha de chama ardente, símbolo da unidade nacional.

O Monumento aos Heróis Moçambicanos é o marco mais antigo que se tem sobre a arte de pintar murais na cidade capital moçambicana. Foi produzido por encomenda, por ordem do Presidente da então República Popular de Moçambique, o Marechal Samora Moisés Machel e supervisionada pelo poeta, advogado, jornalista – militante político e Ministro para a Informação do primeiro governo de Moçambique independente, Jorge Rebelo.  

Foi entregue aos 3 de Fevereiro de 1979, mas devido ao tempo e à acção de forças do ambiente, teve de passar por manutenção, tendo sido reentregue em 2000. 

Escrito por Emanuel Banze para Tsevele

Anuncie